segunda-feira, 4 de julho de 2011

À procura do Lili Leitão teatrólogo.


Luiz Antônio Gondim Leitão (vulgo Lili Leitão) é integrante do movimento literário do Café Paris. Tal movimento, também conhecido como a Roda do Café Paris, é um tesouro cultural fluminense a ser redescoberto.

Num dos cafés da Cidade Sorriso (a, então capital do estado, Niterói), nas primeiras décadas do século XX, boêmios, profissionais liberais, artistas plásticos e jornalistas escreviam, despretensiosamente, uma página importantíssima de nossa história com as letras. Última trincheira das poesias conservadoras (na época em que a vanguarda modernista já se infiltrava nos meios literários), a turma do Paris reunia, além de Lili Leitão, nomes como: Max Vasconcelos, Gomes Filho, Sylvio Figueiredo, Nestor Tangerini, Kleber de Sá Carvalho, Brasil dos Reis e Trina Fox (também os esporádicos e imiscíveis Alberto de Oliveira, Luiz Pistarini e Gutman Bicho).
Embora fosse catedral da poesia dita rigorosa, na qual românticos e parnasianos celebravam missa, foi justamente no Café Paris, com Lili Leitão, que brotou um estilo de poesia de intuição moderna: poesia satírica que bem poderia ser associada a que Juó Bananère (pseudônimo de Alexandre Marcondes Machado) já produzia em São Paulo, e que Furnandes Albaralhão (Horácio Mendes Campos) faria do outro lado da Baia de Guanabara. Assim, Lili Leitão se tornaria, ao mesmo tempo, a ovelha negra e o gênio da raça “parisiense”.
São conhecidos dois livros de Lili Leitão. O primeiro, Sonetos, datado de 1913 (e com relançamento agendado para a próxima Bienal do Rio de Janeiro – 2011 – pelo selo da editora Nitpress); o segundo, Vida apertada: Sonetos humorísticos, de 1926 (publicado em uma segunda edição crítica pela mesma Nitpress, em 2009). Atribui-se ainda um terceiro título ao autor, trata-se do controverso Comidas bravas, obra com poesias fesceninas que, segundo o poeta Luís Antônio Pimentel, seria de data intermediária aos dois outros (estima-se 1923). Este livro constitui uma “lenda urbana”, estando extraviado desde aquela época.

Embora Lili tenha se destacado como poeta, sabe-se que o maior êxito de sua carreira foi o teatro de revista. O próprio autor reconheceria isso no poema “Eu”, quase uma epígrafe de seu Vida apertada, quando nele Lili declara: “Sou poeta, burocrata e revisteiro” (p. 57. Grifo do autor). É verdade, a maioria de sua obra está no teatro. Assim, entre 1913 e 1926 (quer dizer, entre Sonetos e Vida apertada) foram encenadas, com relativo sucesso de público, peças como: Tudo na rua (1914), Então não sei (1915), Pra cima de moi (1916), Logo cedo (1917), Das duas uma, Eu aqui e ela lá e O espora (todas de 1918), Bancando o trouxa, Demi-garçonne (ambas de 1921), A ceia dos presidentes (1924) e O rendez-vous amarelo (1930).
O resgate da literatura de Lili Leitão (e de parte da Roda do Café Paris) carece de uma busca dos textos dessas peças de teatro apenas conhecidas por seus títulos e por anúncios em recortes de jornais de época (como O Fluminense). Fazer ressurgir esta memória é algo que depende de trabalhos como os que vêm sendo elaborados, pacientemente, pelo historiador Emmanuel Bragança de Macedo Soares.
Contudo, ante a absoluta carência de elementos para investigação da obra, solicitamos a todos aqueles que saibam de algum material inédito sobre o teatro de Lili Leitão, bem como da poesia do mesmo autor, que nos notifiquem urgentemente. Caberia, mesmo, uma campanha de busca aos originais das peças de Luiz Leitão. Pedimos, assim, que este apelo seja multiplicado em blogs e sites tornando visível o esforço, quase arqueológico, de retirar o Lili teatrólogo das brumas.

Uma prova do esforço de resgate do teatro de Lili Leitão é dado aqui, no texto inédito, gentil e exclusivamente cedido por Emmanuel Macedo Soares ao Literatura-Vivência:

“Deixando o Cine Teatro Eden, a companhia de Álvaro Diniz inicia a 24 de novembro de 1924 uma vitoriosa temporada no Cinema Coliseu, encerrada intempestivamente a 13 de janeiro do ano seguinte, quando a casa resolve desmanchar o palco para se dedicar apenas à exibição de filmes. A estréia foi fria, com a revista Paris no Rio, de Alfredo Breda, seguindo-se a burleta carnavalesca A flor do tinhorão, de Armando Braga, que também não empolgou, já que o carnaval ainda estava muito longe. Álvaro lembrou do sucesso da revista política O pé de Anjo, de Cardoso de Menezes e Carlos Bittencourt, mas também não deu certo: Pé de anjo era apelido do presidente da República, Artur Bernardes, que há dois anos governava o país sob o chicote do estado de sítio. Trouxe o menino prodígio Petit Encanto, e o público não deu sinais de vida. Todo mundo já vira o garoto, de 8 anos, cuja versatilidade no palco fez efêmera fama nas casas cariocas. O empresário apela para o bairrismo e encena a revista local Não tem importância, de João Carvalhais e Benedito Montes, minhocas da terra. Aí, sim, o teatro começa a lotar. E superlotou a 29 novembro, quando Álvaro descobriu seu veio de ouro, levando à cena a revista Prá cima de muá, de Lili Leitão. Entusiasmado, encomenda outra peça do gênero ao incomparável revisteiro niteroiense. E ele não se faz de rogado, entregando em poucos dias os originais de Niterói em cuecas, que ficou em cartaz desde 17 de dezembro até o melancólico encerramento da temporada. Os cenários de Amadeu Vieira reproduziam vários pontos da cidade, especialmente a Praia de Icaraí, cuja vista ocupava o palco de lado a lado. O grande número de quadros levou o empresário a contratar novos artistas, entre eles Rosália Pombo, Abel Dourado, Júlia Ribeiro, Clotilde Hor Dorgy e Célia Zenatti. Para interpretar os números musicais trouxe um jovem cantor que começava a se destacar nos palcos e paradas carnavalescas, chamado Francisco Alves. Era ainda o Chico Viola das rodas do Estácio e revistas da praça Tiradentes, muito longe de se tornar O Rei da Voz de 1952, quando tragicamente faleceu. Célia Zenatti, companheira no elenco, seria também sua companheira de vida, e por toda a vida.”

(SOARES, Emmanuel de Macedo.
Notas para uma história do teatro em Niterói. Niterói: No prelo)


Vídeo do relançamento de Vida apertada,
na Câmara Municipal de Niterói
(parte I)
 
 
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