sábado, 26 de novembro de 2011

Estamos passando para uma nova era, o que se espera é um mundo melhor...





Êxtase Búdico


Abre-me os braços, Solidão profunda,
Reverência do céu, solenidade
Dos astros, tenebrosa majestade,
Ó planetária comunhão fecunda!

Óleo da noite, sacrossanto, inunda
Todo o meu ser, dá-me essa castidade,
As azuis florescências da saudade,
Graça das graças imortais oriunda!

As estrelas cativas no teu seio
Dão-me um tocante e fugitivo enleio,
Embalam-me na luz consoladora!

Abre-me os braços, Solidão radiante,
Funda, fenomenal e soluçante,
Larga e búdica Noite Redentora!





Divulgação Cultural
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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

De volta do baile, Bilac...





De volta do baile



Chega do baile. Descansa.
Move a ebúrnea ventarola.
Que aroma de sua trança
Voluptuoso se evola!

Ao vê-la, a alcova deserta
E muda até então, em roda
Sentindo-a, treme, desperta,
E é festa e delírio toda.

Despe-se. O manto primeiro
Retira, as luvas agora,
Agora as jóias, chuveiro
De pedras da cor da aurora.

E pelas pérolas, pelos
Rubins de fogo e diamantes,
Faiscando nos seus cabelos
Como estrelas coruscantes.

Pelos colares em dobras
Enrolados, pelos finos
Braceletes, como cobras
Mordendo os braços divinos,

Pela grinalda de flores,
Pelas sedas que se agitam
Murmurando e as várias cores
Vivas do arco-íris imitam,

- Por tudo, as mãos inquietas
Se movem rapidamente,
Como um par de borboletas
Sobre um jardim florescente.

Voando em torno, infinitas,
Precipitadas, vão, soltas,
Revoltas nuvens de fitas,
Nuvens de rendas revoltas.

E, de entre as rendas e o arminho,
Saltam seus seios rosados,
Como de dentro de um ninho
Dois pássaros assustados.

E da lâmpada suspensa
Treme o clarão; e há por tudo
Uma agitação imensa,
Um êxtase imenso e mudo.

E, como que por encanto,
Num longo rumor de beijos,
Há vozes em cada canto
E em cada canto desejos...

Mais um gesto... E, vagarosa,
Dos ombros solta, a camisa
Pelo seu corpo, amorosa
E sensualmente, desliza.

E o tronco altivo e direito,
O braço, a curva macia
Da espádua, o talhe do peito
Que de tão branco irradia;

O ventre que, como a neve,
Firme e alvíssimo se arqueia
E apenas embaixo um leve
Buço dourado sombreia;

A coxa firme, que desce
Curvamente, a perna, o artelho;
Todo o seu corpo aparece
Subitamente no espelho...

Mas logo um deslumbramento
Se espalha na alcova inteira:
Com um rápido movimento
Destouca-se a cabeleira.

Que riquíssimo tesouro
Naqueles fios dardeja!
É como uma nuvem de ouro
Que a envolve, e, em zelos, a beija.

Toda, contorno a contorno,
Da fronte aos pés, cerca-a; e em ondas
Fulvas derrama-se em torno
De suas formas redondas:

E, depois de apaixonada
Beijá-la linha por linha,
Cai-lhe às costas, desdobrada
Como um manto de rainha...





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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Octavio Paz na data do "Encontro de Niterói com a América Latina"





Em nossa cidade ocorre o  Encontro de Niterói com a América Latina. Quem desejar saber mais sobre o evento, pode clicar nos links que disponibilizo abaixo. Em nosso caso, a contribuição de Literatura-Vivência para o espírito de intercâmbio cultural do evento não poderia ser outra senão um quinhão literário-vivencial: uma tradução (própria) do poeta e intelectual latino-americano Octavio Paz.
Mesmo sabendo que Miguel de Unamuno condenava as traduções – especialmente a de poesias –, preciso me inclinar a pensar a viabilidade dessa prática (apoio-me em Ronái e em Geir para tal). Até para que este projeto ocidental-renascentista (lembremos que a tradução é uma invenção europeia, a ponto de, em algumas línguas asiáticas, a palavra “tradução” sequer existir) ganhe concretude no evento em questão; até para que o sonho de la unidad de Latino America, alentado uma geração antes da minha, possa ser novamente nutrido.

Vejamos a poesia de Octavio Paz, hoje dedicada por mim à escritora Branca Eloysa:


                                                                                                                                   Octavio Paz


Destino del poeta

¿Palabras? Si, de aire,
y en el aire perdidas.
Déjame que me pierda entre palabras,
déjame ser el aire en unos labios,
un soplo vagabundo sin contornos,
breve aroma que el aire desvanece.

También la luz en sí mesma se pierde.

Destino del poeta

Palavras? Sim, de ar,
e perdidas no ar.
Deixe-me que perca entre palavras,
deixe-me ser no ar entre uns lábios,
um sopro vagabundo sem contornos,
breve aroma que no ar se desvanece.


Também a luz em si mesma se perde.


Escritura

Cuando sobre el papel la pluma escribe,
a cualquier hora solitaria,
¿quién la guía?
¿A quién escribe el que escribe por mi,
orilla hecha de labios y de sueño,
quieta colina, golfo,
hombro para olvidar al mundo para siempre?

Alguien en mí, mueve mi mano,
escoge una palabra, se detiene,
duda entre el mar azul y el monte verde.
Con un ardor helado
Contempla lo que escribo.
Todo lo quema, fuego justiciero.
Pero este juez tambiém es víctima
y al condenarme, se condena:
no escribe a nadie, a nadie llama,
a sí mismo se escribe, e sí se olvida,
y se rescata, y vuelve a ser yo mismo.

Escritura

Quando sobre o papel a penas escreve,
em qualquer hora solitária,
quem a guia?
A quem escreve o que escreve por mim,
margem feita de lábios e de sonho,
quieta colina, golfo,
ombro para esquecer do mundo para sempre?

Alguém escreve em mim, e move minha mão,
escolhe uma palavra, se detém,
oscila entre o mar azul e o monte verde.
Com um gélido ardor
Contempla o que escrevo.
Queima a tudo, fogo justiceiro.
Mas este juiz também é vítima
e ao me condenar, se condena:
não escreve a ninguém, a ninguém chama,
a si mesmo se escreve; em si mesmo se esquece,
e se resgata, e volta a ser eu mesmo.




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