terça-feira, 10 de julho de 2012

Em defesa de um intelectual



 
 
 
 
Mais de um vez me vejo instado a dar minha opinião contra a injustiça imerecida e leviana, e desta vez da injustiça duplamente maléfica, que é a do apagamento de fatos e feitos do engenho humano, de quem tem ainda bem iluminada a chama de acreditar na possibilidade de nunca se deixar datado em sua práxis cultural e dos saberes regionais e universais.
Desrespeitar ou ignorar a obra e o nome com raro brilho conquistado pelo professor M. Paulo Nunes, sobretudo a partir de sua regresso de Brasília, depois de uma longa permanência ali, para dar continuidade a metas e projetos de realizar-se como escritor e educador tendo a cultura piauiense como seu maior objetivo primacial de vida no plano intelectual, não faz sentido e só prejudica a imagem de um estado que, em geral, é carente de maior visibilidade no país.
Não faz bem a grupos de artistas piauienses procurar indispor-se com uma figura que representa a inteligência do Piauí em tantos dados simbólicos da cultura do estado, pelo que imensamente já realizou no campo intelectual e em realizações concretas na sua acepção mais genuinamente piauiense. Uma vez, um membro da Academia Brasileira de Letras me confessou que Paulo Nunes, pelo nível de cultura e sofisticação que alcançou, possa por vezes se sentir um pouco deslocado num meio ainda em alguns aspectos provinciano.
Além de ser uma reação intempestiva e desabonadora a que foram levadas algumas pessoas que se fazem identificar como gente ligada ao mundo artístico local, esses supostos artistas desrespeitaram um eminente intelectual, num desacato à função orientadora ou mais consultora, conforme lembra o professor Cineas Santos em defesa do Presidente do Conselho de Cultura do Piauí.
Ora, senhores detratores do saber alheio, todos temos conhecimento de que o crítico M. Paulo Nunes já é uma pessoa idosa, mas isso não nem deve ser nunca motivo de um artista (?!) escarnecer, como demonstração da mais rasteira ignorância, da condição de idade elevada de M. Paulo Nunes, inclusive infringindo um dos princípios fundamentais do Estatuto do Idoso, que é o de desrespeito ou injúria à imagem dos mais velhos, quando países de cultura desenvolvida, como o Japão, tratam seus idosos com o maior carinho e reverência. Grandes universidades nos EUA e na Europa fazem questão de nunca se desligarem da orientação e dos préstimos valiosos de seus scholars, ao contrário de nosso país que não tem apreço em geral pelos mais avançados em idade.
No caso desse simplório que fez piada de mau gosto com a idade de M. Paulo Nunes, como se idade mais avançada fosse uma doença, e ainda desinformando toscamente quem o ouvisse de que o ensaísta piauiense só era conhecido por 70% dos piauienses, tenho o seguinte a adverti-lo : o mundo e o tempo nasceram para todos. Se essa sua obtusidade de nascença e falta de neurônios tanto o prejudicam, lembre-se de que o professor M. .Paulo Nunes, além de ser um ilustre intelectual, admirado por muita gente da cultura nacional, jamais caberia na falta de juízo argumentativo de sua estreita cabeça de “artista” apagado e invisível, já que os que conhecem o ensaísta são os que leem, os que amam os livros, os que estudam, os que produzem e levam a cultura piauiense adiante.
O maior exemplo disso é que, nos meios acadêmicos universitários, temos pesquisadores estudando, elaborando trabalhos de pós-graduação com recortes focando a participação de M. Paulo Nunes na renovação das letras piauienses nos anos 40, ao lado de ºG. Rego de Carvalho, H. Dobal, Celso Barros Coelho, Afonso Ligório, entre outros, conforme também sobre esse tópico se debruçaram jovens ensaístas piauienses, como Halan Silva ( As formas incompletas – apontamentos para uma biografia. Teresina: Oficina da Palavra, 2005) João Kennedy Eugênio e Halan Silva (Cantiga de viver – leituras (Teresina: Fundação Quixote, 2007).Da mesma forma, nesta última obra, entre jovens ensaístas, M. Paulo Nunes assina ensaio de análise do poeta piauiense H. Dobal,
Desta maneira, M. Paulo Nunes, incansavelmente, e até os dias atuais, no jornal na revista, no livro, na conferência leva a cultura piauiense adiante fundamentado numa experiência da sabedoria dos eruditos, dos que leram o mundo naquilo que ele tem de mais profundo em várias frentes do conhecimento humano, de culturas e gerações diversas, de visões polifônicas, de teorias, das artes mais populares às mais requintadas, do teatro clássico, popular de puras raízes, da música, em suas várias formas, da pintura, da arquitetura, das artes cênicas, do cinema, do contato com as grandes capitais do mundo, do convívio amplo com as melhores inteligências do país, na filosofia, na educação, na política, no direito, história literária, na crítica, no ensaio, na sociologia, na história, na literatura universal, no convívio íntimo de tudo o que se produziu no Piauí pelos seus grandes homens, enfim, nos multifacetados saberes da inteligência humana.
No fundo, as desavenças no Conselho Estadual de Cultura não seriam só isso, mas, quem sabe, cabalar para destituir o atual Presidente e substituí-lo - eis o perigo - por alguém que não estivesse à altura das atribuições de um órgão de alta envergadura cultural. Aproveitando-se da circunstância de que um pretendente a membro do Conselho, não teve seu pleito atendido, o que não poderia acontecer dado que a escolha do Presidente cabe ao poder executivo.
Ora, tal fato gerou ressentimentos e melindres da parte da classe de artistas e é nesse ponto que do ressentimento passou-se à indignação de quem se considerava pouco representado como classe que reivindicava maior voz e vez nas decisões de representação de classe do Conselho Estadual de Cultura, mas em vão, porque desprovida de conhecimento dos valores culturais, das ciências e dos estudos, das leis, das normas e da memória histórico-cultural de uma personalidade que, ao longo de sua atuação como escritor, educador no sentido mais refinado do termo, professor emérito da UFPI e com um extraordinária e invejável folha de serviços prestados à vida intelectual piauiense, somente foi movida pelo bem-estar do órgão que dirige com dignidade e que já faz parte de sua vida e de seu espírito de escol. A revista Presença, já no seu número 47, é a mais viva prova desse escritor tão representativo de seu povo e de suas tradições.
A esta altura em que se encontra com o seu tempo de fecunda e vibrante lucidez de homem de letras apoiado em anos e anos de trabalho e dignidade de ações, de estudioso, de um disciplinado em tudo que faz com consciência plena do alcance maior de sua missão, o professor M. Paulo Nunes sem favor merece, por tudo que fez pelo Piauí, no domínio da inteligência e do seu desenvolvimento social, cultural, histórico e artístico e o que mais possa ser objeto de sua semeadura em outras direções do seu pensamento crítico-cultural da vida contemporânea, a posição que atingiu, na condição ímpar de ser talvez uma das mais respeitadas figuras piauienses da atualidade.
 
 


Divulgação Cultural
(Clique na imagem para ampliar)
 
 

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Curso "Vida e obra de Machado de Assis", ministrado por Maximiano de Carvalho e Silva




Curso de atualização
Promovido pela Sociedade Sousa da Silveira
Centro de Cultura Humanística e de Crítica Textual

Machado de Assis, em caricatura de Baptistão

INTRODUÇÃO AO ESTUDO
DA VIDA E OBRA DE MACHADO DE ASSIS
E À LEITURA DO ROMANCE DOM CASMURRO
(Setembro - outubro de 2012)
Curso organizado e ministrado pelo Prof. Dr. Maximiano de Carvalho e Silva, Professor Emérito da Universidade Federal Fluminense, aposentado no serviço público como Titular de Filologia / Crítica Textual da Universidade Federal Fluminense.  Diretor Executivo do curso: Prof. Dr. Roberto Kahlmeyer-Mertens.
Cinco palestras, uma por quinzena, com a duração de três horas cada uma delas, no horário das 15 às 18 horas, aos sábados.
Dias previstos: 1.o,15 e 29 de setembro; 6 e 20 de outubro.
Local: Rua Osvaldo Cruz, em Icaraí, Niterói, no apartamento-escritório do palestrante.
Número limitado de inscrições (20 no máximo).
Cada palestra será dividida em duas partes, com um intervalo de 20 minutos: a) exposição do tema; b) preparação para a leitura do romance.
Inscrições abertas a partir do dia 20 de julho.  Taxa de inscrição obrigatória: R$ 30,00 (trinta reais).  Para outras informações, utilize os emails maximiano@infolink.com.br e kahlmeyermertens@gmail.com .
Pagamento de apostilas para acompanhar as palestras apenas para os que desejarem recebê-las, com a devida antecedência.

Temas a serem expostos e debatidos:
1 – Vida e obra de Machado de Assis:
1.1 - O contexto histórico-cultural da sua época.
1.2 - Os seus principais dados biográficos.
1.3 – Machado de Assis e a literatura brasileira.
1.4 – Fontes para o estudo da vida e obra do escritor.
2 – Introdução à leitura do romance Dom Casmurro:
2.1 – Etapas da elaboração de uma edição crítica.
2.2 – A preparação da edição crítica de Dom Casmurro.
2.3 – Fortuna crítica do romance e as leituras para ele propostas.
2.4 – Estudo especial de traços da língua e estilo e do vocabulário machadiano em Dom Casmurro.




Divulgação Cultural
(Clique na imagem para ampliar)


domingo, 8 de julho de 2012

Os intelectuais não se entendem





No passado e no presente a história literária brasileira está mergulhada em intrigas, invejas, ressentimentos, vias de fato, injustiças, indiferenças e, em nível mais elevado de debate, em polêmicas. A começar das incompreensões no próprio seio dos movimentos literários ou periodizações, as dissensões se instalam com grupos novos defendendo suas propostas ou manifestos de independência no que respeita ao estilos ou estilos anteriores, o que, de alguma maneira, explica ou justifica a dinâmica interna e específica do fazer literário. Não deixa de ser um jogo ancestral entre a velha e a nova geração num período histórico considerado.
Quem chega, deseja a desestabilização do estilo anterior, como se o novo fosse sempre “superior” ou “melhor” do que o antigo. Nada mais longe da verdade. O caráter de dinamismo da escrita literária fala mais alto do que as relatividades das vanguardas. O que convém ter em mira é o sentido de modificações que instrumentalizadas pelas realidades sociais e culturais diferentes acompanhando o ritmo da História, sem vezos de alcances de perfeição e formas ideais.
Portugal e o Brasil são dois países em que a polêmica alcançou, mais naquele do que neste, considerável fortuna crítica. Em Portugal, cujas primeiras notícias datam da época dos trovadores e jograis, serve de ponto alto a polêmica conhecida como “Questão Coimbrã”, embate ácido entre o Romantismo e o Realismo, dividindo, no plano intelectual, figuras consagradas da velha geração liderada por Antônio Feliciano de Castilho(1800-1875) apoiado pelo destemido e mordacíssimo romancista Camilo Castelo Branco (1825-1890). Do outro oposto, representando as novas idéias os escritores Antero de Quental (1842-1891) e Teófilo Braga (1843-1924) procurando desqualificar o Romantismo chamado “decadente,” encarnado na produção ficcional de Camilo Castelo Branco.
No Brasil, segundo Naief Sáfadi, a polêmica não é tema tão freqüente assim, podendo-se asseverar que um dos seus capítulos mais conhecidos é aquele alusivo ao poema “A Confederação dos Tamoios” (1857), de Gonçalves de Magalhães (1811-1882) polêmica que resultou na publicação de oito cartas de José de Alencar reunidas em Cartas sobre a Confederação dos Tamoios (1860) escritas sob o pseudônimo de “Ig.” Nelas Alencar assinala como defeito na elaboração daquele poema a ausência de vigor poético e, além disso, refere à precariedade de sua maneira de conceber a figura do índio, segundo ele, artificialmente composto. Ora, o próprio Alencar foi também, por sua vez, vítima de crítica semelhante, que lhe apontavam idealizações exageradas na caracterização física e psicológica do indígena brasileiro. Em defesa de Magalhães, saíram Araújo Porto Alegre (1806-1879) e o imperador D. Pedro II (1825-1891). Defendendo Alencar esteve Pinheiro Guimarães (1832-1877)
Outras polêmicas, na década de 1880, poder-se-iam mencionar aqui. As de Carlos de Laet (1847-1927) com os portugueses Camilo Castelo Branco e Castilho e outra com Valentim Magalhães(1859-1903) sobre uma questão até sem muita relevância, a de saber (!) quem seria o melhor poeta brasileiro Gonçalves Dias (1823-1864), Castro Alves (1847-1871) ou Luís Delfino (1834-1910).
Ainda naquela mesma década, houve uma destacada polêmica entre Júlio Ribeiro (1845-1890), romancista, gramático e filólogo, famoso por sua verve cáustica em assuntos de política (Cartas sertanejas, 1885) e o Pe. Sena Freitas, a propósito do romance naturalista, A carne, zombeteiramente chamado “A carniça” pelo crítico Agripino Grieco ( 1888-1973).
Algumas outras polêmicas se tornaram suficientemente divulgadas: a de Tobias Barreto (1839-1889), em 1883, com os padres maranhenses Joaquim Albuquerque (1867-1934) e Casemiro da Cunha, sobre questões de clericalismo no meio cultural brasileiro. As polêmicas de Sílvio Romero (1851-1914) com Teófilo Braga, com José Veríssimo (1857-1916) e com o gramático Laudelino Freire (1873-1937)
Famosa ficou também a polêmica de Rui Barbosa (1849-1923) que manteve com o seu ex-professor Ernesto Carneiro Ribeiro() versando sobre a redação do Código Civil Brasileiro (1903). Em resposta às críticas de Carneiro Ribeiro, Rui escreveu a célebre Réplica à defesa da redação do Código Civil Brasileiro, 1904) que lhe valeu, da parte do opositor, uma Tréplica.
Anos depois, outras polêmicas surgiram, como aquela travada entre Cassiano Ricardo (1895-191974) e Fernando de Magalhães tendo por eixo da discussão Cecília Meireles (1901-1964) e a Academia Brasileira de Letras. Osório Borba e Menotti del Picchia (1892-1988) polemizaram sobre o tema da crítica literária brasileira, Osório desanca o regionalismo e o caráter personalista daquela crítica.
Não podemos esquecer entre outras, as polêmicas entre o Pe.. Leonel Franca (1893-1948) e José Oiticica(1882-1957). Em outra ocasião, Oiticica, que era anarquista e gramático, terçou armas com o linguista e filólogo Sílvio Elias (1913-1998).
Finalmente, para não alongar o objetivo deste artigo, que não é o de desenvolver em profundidade o tema da polêmica literária no país, lembraria a polêmica acérrima entre dois críticos de grande valor, mas de diferente tendência teórica e visão cultural : Álvaro Lins (1912-1970) e Afrânio Coutinho(1911-2000). A raiz da polêmica situa-se a partir da publicação da obra de Coutinho, A filosofa de Machado de Assis (1940). A natureza dessa polêmica tem fundamentação argumentativa nos campos da estilística e da visão crítica de autores que influenciaram a ficção machadiana. A meu ver, a diatribe, até extrapolando para o plano pessoal, foi, primeiro, provocada por um ensaio de Lins sobre aquela obra de Coutinho. A reação de Coutinho foi imediata e duríssima.
Todos esses comentários me vieram à baila após recentes leituras de duas crônicas de Ferreira Gullar publicadas na sua coluna do Caderno Ilustrada da Folha de São Paulo, nas quais menciona o nome de Augusto de Campos a respeito de uma afirmação deste sobre o que pensava do escritor e poeta modernista Oswald de Andrade (1890-1954). O fato se resume no seguinte: num encontro de Gullar com Augusto de Campos, no Rio de Janeiro, em 1955, na Spaghettilândia, na Cinelândia, Centro do Rio. Gullar relatou numa das crônicas acima referidas que Augusto chamara Oswald de Andrade de “irresponsável.”, julgamento que Gullar imediatamente rechaçara.
Augusto de Campos, em artigo recente publicado naquele mesmo jornal, desmentiu o que Gullar escrevera a respeito do encontro, afirmando que não houve tal encontro, mas não negou que chamara Oswald de Andrade de “irresponsável”.
Pelo que conheço de Gullar, o que a questão levanta é não só evidência de vaidade da parte que pretende ter sido quem julgou com acerto – o que não foi o caso de Augusto de Campos - e de forma antecipadora um escritor de inegável qualidade como Oswald. Ao contrário, fora Gullar quem acertara em cheio no julgamento justo e antecipado sobre a poesia de Oswald de Andrade.
Quanto a saber se Augusto de Campos, numa releitura mais cuidadosa da obra de Oswald, conseguiu que o autor de Serafim Ponte Grande (1933) fosse reconhecido como figura de relevo na poesia brasileira, isso torna as justificativas de Gullar bastante louváveis.
Agora, ao trazer à discussão a questão do encontro e da opinião negativa de Augusto para um deslocamento de assunto relacionado à dúvida sobre o valor e importância de poemas de Gullar, a história se complica e, então, não há como não tomar o partido de um poeta de alta expressão como Ferreira Gullar. Daí para diante, de um lado e de outro, os entrerveros só a custo conseguem se manter em bases educadas, uma vez que a verrina da polêmica já se instalou nos campos intelectual e pessoal, o que, no último caso, empobrece qualquer polêmica em alto nível conduzida. É uma pena que assim hajam chegado a tais divergências.

NOTAS:

1.SÁFADI, Naief. Verbete sobre “Polêmica” na literatura brasileira. In: Dicionário de literatura (direção de Jaccinto do Prado Coelho). 3 ed., 2º vol. L/S. Porto: Figueirinha, p. 838-839. Ver também o verbete “Polêmica” na literatura portuguesa. PRADO COELHO, Jacinto do. Idem, ibidem, p. 837-838.
2. Nomes de escritores cuja indicação de data de nascimento e morte não aparecem neste artigo serão incluídos posteriormente no corpo do texto logo que devidamente localizados. A ressalva vale também para os nomes de obras e datas de publicação




Divulgação Cultural
(Clique na imagem para ampliar)