“Ser anfitrião das belas letras.”
Com esta legenda, o presente Blog pretende abrir espaço para os talentos da literatura (com ênfase na fluminense). Tal sítio é reservado ao fomento e divulgação da boa poesia, da crônica, do conto, da crítica e, também, da vivência em meio às Instituições acadêmico-literárias. Preservar a memória dessa literatura, promover o trabalho de autores cujas obras já se encontram consolidadas e apoiar as promessas que ingressam na senda literária é o nosso papel.
Capa da segunda edição de Presença da Cultura Fluminense, de Horácio Pacheco.
No próximo dia 21, durante as
comemorações de aniversário de 95 anos da Academia
Fluminense de Letras, será relançado o livro “Presença da Cultura Fluminense”. O livro registra uma palestra de
Horácio Pacheco (que foi Presidente da Academia Niteroiense de Letras por décadas e membro de outras instituições como a Academia Fluminense de Letras e do Instituto Histórico Geográfico de Niterói).
Tal palestra, feita às vésperas da fusão do estado da Guanabara com o antigo
estado do Rio de Janeiro, externa os anseios de mestre Horácio diante da nova
situação cultural que seria criada naquela ocasião. Trata-se de um livro
histórico, portanto!
A nova edição organizada por R.
S. Kahlmeyer-Mertens (membro da AFL que
também assina o prefácio desta segunda colação), conta, ainda, com o prefácio
da primeira, de autoria de Lyad de Almeida e com um texto de
apresentação/justificativa da edição, assinado por Luiz Augusto Erthal (Publisher
da Nitpress, por onde o livro será
editado).
Esta nova edição denota o esforço
de novas e antigas gerações por
retomar o melhor da literatura fluminense e, por meio desta, a identidade
cultural do estado do RJ.
1) No aconchego do útero, a Velhice começa a tecer
sua teia.
2)
Descartada a sedução dos eufemismos, Velhice é Velhice mesmo e como tal deve
ser vivenciada.
3)
A Velhice suaviza-se pela aceitação do inexorável e pelo desejo de agir na
construção do ainda possível.
4)
Qualquer pessoa tem o direito de assumir a Velhice e de expor, sem
constrangimentos, as marcas do tempo.
5)
Idade avançada, por si só, não impõe respeito. Os canalhas também envelhecem.
6)
Ao velho são permitidas, anualmente, meia dúzia de ranhetices e igual
quantidade de impertinências, pelas quais será perdoado sem necessidade de
penitências.
7)
São prerrogativas do portador de Velhice pijama de flanela e meias de lã para
esquentar o corpo e afeto de netos para aquecer a alma.
8)
A quem envelheceu é facultado cozinhar o presente em fogo brando e o futuro em
banho-maria.
9)
O sonho não é privativo do jovem. Também ao velho reserva-se o privilégio de
adubar quimeras.
10) Envelhecer com dignidade é caminhar serenamente em
direção ao crepúsculo.
Fui ontem à praia. Parei na calçada, olhando a mim mesmo, eufórico, entre Wanda, Marly, Eduardo, Ludmila e outros. O sol dourava corpos e colocava em cada coisa a cor adequada. Lentamente, a paisagem ia se formando bem perto do mar, nem verde, nem azul. Dava maior atenção a Wanda, a quem amava e ainda hoje guardo na memória, um tanto triste e amargo.
Da praia até a rua onde Wanda morava, em tempos de verão, o caminho era claro e perfumado pela brisa leve que soprava do mar, carregada de iodo. Isso me alegrava e a ela também. Nossos sentimentos pareciam explodir e as palavras trocadas sonoras e irisadas de amor, de paixão. O diálogo sempre terno conduzia-nos a uma atmosfera de sonhos e impossibilidades. Grande a nossa atração – corpos banhados de sal recente, na livre comunhão com o mar.
“Ricardo, procurei por todos os meios compreender-me primeiro, para fazer uma revelação menos chocante, a fim de evitar prantos. Chorei muito ontem, ao ver o voo lindo das gaivotas sobre omar. Você estava com toda a razão acerca daquele sinal geométrico que você desenhou na areia e que eu apaguei logo com minhas mãos nervosas. Ludmila sabe de nossas angústias. Mais das minhas, talvez. De mim, posso dizer que sou triste-alegre ou alegre-tristonha. Uma boba que sou, é a verdade. Uma coisa: meus olhos nunca mentiram a você. Sei que você exigiu definição. Daí aquele despedir rápido, com muito medo do amor que surgia forte, prenúncio de algo que suspeitava estranho e que em absoluto não merecíamos. Agora, sinto o entardecerde tudo, inclusive de nós. Dormi profundamente e despertei num mundo diferente; sem mar, sem você. Escrevo, porque há séculos você espera uma satisfação de minha parte, tenho certeza. Confesso que escrevo com medo do malque possa causar. Aproveito o momento, pois acho-me lúcida. Lúcida, mas com medo. As crianças estão impossíveis, aguardando o pai. O apartamento é razoável e você nunca deverá me visitar. Um abraço e tchau. Wanda – PS.: Disse estar lúcida. Puro engano. Meus olhos secaram, Ricardo, mas estão à espreita da primavera”.
Corri ao encontro de mim e bati nos ombros dele. Levava-lhe acarta. Pareceu não me notar. “Sou eu, sou eu!” – disse-lhe repetidas vezes.
Olhares me consumiam na manhã tropical e surpreendi-me traindo amim mesmo, ao outro que era eu. Wanda percebeu e ficou confusa, a ponto dese denunciar totalmente. Ela adivinhava, naquela hora, todo o futuro e reconhecera o papel que eu trazia, já meio amassado, numa das mãos. Num gesto silencioso apontou-me Ludmila, que sorriu, cumprimentando-me. “A verdade, amigo, só muito depois”.
Não pude evitar o que estaria por vir. Ele insistia e era feliz. Olhei-os: no mar, deitados na balsa colorida, flutuantes e descontraídos, Wanda e o outro que era eu respiravam fundo, fixando o céu. Lembrei, então, das margens floridas de um caminho que idealizei para nós dois. Mas a realidade sempre me deu socos na boca do estômago. Aliás, o mal-estar era o mesmo que.
Ludmila já revelou o mistério. Nesse momento, regressei a mim na calçada da praia e notei os gritos trágicos que as gaivotas emitem antes do mergulho solitário.